Um consultor que visita empresas no seu trabalho deixou outro dia um bilhete para o RH (gestor geral de Recursos Humanos) de uma grande empresa da região. Ele quis testemunhar que se sente muito confortável ao visitar essa Empresa, falar com as pessoas dali e principalmente com os gestores, pessoas que deveriam andar mais estressadas porque sempre submetidas à pressão de metas, resultados, melhorias.
No breve relato o autor finaliza o bilhete dizendo que ali há uma “empresa simpática”, frisando que elas existem mesmo, como também outras que poderia bem intitular de “antipáticas”.
Muros, máquinas, equipamentos são muito parecidos. O que diferencia uma empresa de outra são as pessoas, daí a observação do visitante atento.
Fiquei pensando que, numa visão mais ampla, é isso mesmo. Há organizações – independentemente de seu porte – que respiram bom clima, as pessoas estão concentradas no labor com um ar de tranquilidade, inclusive cumprimentam os visitantes olhando nos olhos, com vibração.
São empresas “quentes”, acolhedoras, onde provavelmente um supre a limitação do outro e a resultante do trabalho das equipes é muito superior à soma das potencialidades individuais.
Noutras você sente a diferença logo à chegada, na Portaria, com um tratamento frio, distante e terceirizado de corpo e alma. No interior delas, pessoas cabisbaixas, casmurras, mal cumprimentam, ambiente denota certa tensão.
Essas organizações funcionam – e às vezes com bons resultados – com relações mais duras predominando a desconfiança, a individualidade e os feudos – grupos que defendem com afinco seu espaço mesmo em detrimento do conjunto geral. Trabalham duramente o tempo todo, pois a vigilância é grande, mas uma parte do tempo (energia) é gasta para “segurar o tapete” como se diz jocosamente nas fábricas.
O profissionalismo, existe, mas é flex, ou seja, as estruturas formais são “baipassadas” por dirigentes que têm seus tentáculos, pessoas de sua confiança que transmitem o que vai “lá em baixo”. Há estímulo para esse comportamento, e assim a gestão vai se tornando por conflitos. Uns vibrando por levantar a falha do outro, e assim ganharem alguns pontinhos a mais junto ao “alto poder”, que se regozija !
O poder estratégico, com visão privilegiada, admira e estimula acreditando que assim fica mais seguro porque as áreas estão se digladiando mesmo que veladamente, e com isso todos vigiam todos.
Mas, e a integração e a cooperação? E o clima organizacional? E a união de propósitos para que os grandes desafios da empresa sejam superados com menos custo e desgastes? Muitas vezes essas empresas ainda ostentam em suas paredes belos discursos de Missão, Visão e Valores feitos sob medida para atender às exigências formais do sistema de Gestão da Qualidade.
Os órgãos de RH dessas empresas podem colaborar na melhoria das relações interpessoais e interdepartamentais. Identificar distorções, excessos e trabalhar no sentido de ajustes, correções, redução de stress com trabalhos coletivos, coaching e aconselhamentos. Entretanto, se a alta cúpula acena no sentido da ‘competição’ desenfreada fica difícil, se não impossível – as pessoas miram-se nos grandes comandos para se perpetuarem nos seus cargos. E o RH fica enxugando gelo.
Uma vez um diretor de alto escalão me falou, reservadamente: “algum dia ainda vou escrever um livro sobre como fazer administração por conflitos”. E baixou a cabeça, entristecido e esperando, talvez, umas palavras de alento e conforto de “seu” RH…
As empresas/pessoas precisam trabalhar duramente, com metas arrojadas, superando os obstáculos naturais para vencer a concorrência e posicionar-se de forma competitiva no mercado global. Toda energia deveria estar concentrada nisso, e não na fofoca, na maledicência e no leva-e-traz. As não conformidades precisam ser tratadas à luz da realidade, erros corrigidos pedagogicamente para que não mais aconteçam. E todos torcendo pelo resultado geral, e não apenas pelo sucesso de seu reduto/setor em visão egoísta.
Feliz a organização que consegue passar aos seus visitantes (e… clientes, representantes, fornecedores, parceiros) a visão de “empresa simpática”, que mantém relações pessoais de confiança, respeito e profissionalismo. Nela os resultados chegam com menor custo para todos, espaço onde os trabalhadores saem cansados do trabalho forte, mas felizes porque o ambiente ajuda e há recompensas não apenas materiais.
E podem dormir uma noite reparadora e tranquila, sem apelar ao Rivotril ou assemelhados.
Sobre o autor:
Celso Gagliardo foi gestor de RH de grandes e médias empresas, hoje consultor e treinador de Lideranças.
e-mail: gagliardo.celsoluis@gmail.com
Sempre acompanho e gosto muito dos artigos escritos e publicados aqui pelo Celso Gagliardo, todos muito bons e atualizados com o mundo corporativo e do RH. Esse acompanha os demais, tema bem interessante, a percepção de empresa simpática ou não é bastante clara e foi muito bem retratada aqui. Parabéns Celso.
Muito boa esta matéria, que trata de um tema pouco abordado nas literaturas sobre RH, talvez por conta de um certo subjetivismo, mas que é ponto importante, na medida em que funciona como um termômetro de clima organizacional nas organizações. Parabéns ao autor.