A meditação mindfulness no ambiente organizacional

Dr. Martin Portner
Dr. Martin Portner

O uso perseverante da meditação mindfulness, mesmo por dez minutos diários, traz efeitos de longo prazo – clareza cognitiva, maior criatividade e o predomínio de sentimentos positivos sobre os negativos –, as transformações mais cobiçadas pelos gestores de RH nas instituições organizacionais.
 Dr. Martin Portner

Nos últimos dias de janeiro de 2015, David Ford chegava em seu escritório em Wall Street e recebia centenas de feeds reportando o mergulho inclemente das ações na Bolsa de Nova Iorque.

Nos próximos dias, Ford, dono de uma corretora de Fundos Hedge, fazia o que seria impensável para ele anos atrás – comprava ações a preços desvalorizados no meio de uma feroz crise econômica que assolava os EUA, enquanto seus concorrentes vendiam o que podiam ao preço que fosse possível.

A causa disso, na opinião de Ford? Bem, diz ele, “boa parte disso vem dos 20 minutos de meditação mindfulness que faço pela manhã antes de qualquer outra coisa no dia”.

A Latigo Partners, da qual Ford é sócio fundador e diretor de portfólio, galgou um degrau de 24% no ano passado. “Antigamente, a movimentação das ações me causava um frio na barriga. Agora, a reação é diferente, ela é mais sinalizadora”, completa Ford, 50 anos, economista formado pela Universidade de Connecticut.

A meditação mindfulness, chamada de Vipassana pelo budismo secular, foi trazida para o ocidente nos anos 90. O neurocientista Jon Kabat-Zinn viu nela a possiblidade de ajudar pessoas, com dor, inflamações e doenças imunológicas. O resultado foi positivo. Mas o tema ganhou rapidamente o interesse de outras plateias: foi para as universidades, o governo, as forças armadas e hoje está presente nas grandes corporações norte-americanas, como Aetna, Intel e Goldman Sachs, para citar algumas.

Na Aetna, empresa que comercializa planos de saúde nos EUA, o mindfulness começou um pequeno programa piloto do qual participaram 239 colaboradores. Os resultados? Os participantes nos cursos de 12 semanas relataram redução significativa do estresse que, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, custa às empresas americanas cerca de 300 bilhões de dólares anuais. Hoje, mais de 25% da força de trabalho da Aetna, que compreende 50 mil colaboradores, têm participado em pelo menos uma classe de mindfulness. Desde então houve uma redução média de 28% nos níveis de stress e aumento de 20% na qualidade de vida. A empresa festeja – os colaboradores se tornam mais eficazes na jornada de trabalho, ganhando uma média de 62 minutos por semana de produtividade.

Os custos de saúde anuais daqueles que participaram do programa caíram, em média, dois mil dólares em relação aos demais colaboradores.

Na Intel, outra de uma série de empresas que adotaram o programa mindfulness, os 1.500 funcionários que participaram no curso de 19 sessões foram solicitados a classificar os seus níveis de estresse e contentamento em uma escala de 10 pontos. Ao final das sessões, os participantes relataram que os níveis médios de stress tinham diminuído dois pontos, enquanto o contentamento tinha subido três. Além disso, relataram o aumento de dois pontos em aspectos como “ter novas ideias, insights, clareza mental, criatividade, capacidade para se concentrar, qualidade nas relações de trabalho e o nível de envolvimento em reuniões, projetos e esforço da equipe”.

Colaboradores da Goldman Sachs, banco internacional de investimentos, ocupam uma paciente lista de espera para poderem se matricular nos cursos onde monitores especializados ensinam a sintonizar a mente com a respiração em ambientes adaptados para esse fim. Negociadores de mercado seniores destacam que a meditação lapida o brilhante bruto do instinto de negócios. A maioria acrescenta que se tornou mais fácil desligar a mente após a jornada de trabalho e que conseguem dormir melhor à noite.

No Brasil ainda não se sabe a extensão com a qual o mindfulness é utilizado nas empresas. O CEO Jorge Lopez fez questão de introduzi-la na organização que comanda com o objetivo de melhorar seu desempenho. Ao assumir a presidência da 3M do Brasil, em agosto de 2014, Lopez adotou o mindfulness na empresa. Cerca de 180 pessoas do corpo diretivo e gerentes seniores passaram pelo treinamento, cuja duração consiste de oito encontros semanais de uma hora e meia.

Mas afinal, qual é o motivo que gerou esse interesse organizacional pelo mindfulness?

Segundo a HSM Management, principal publicação de gestão e liderança do Brasil, trata-se de um método ou ferramenta que permite a aliviar a sobrecarga mental dos executivos e contribuir para que eles consigam dedicar mais atenção às tarefas diárias. Bem, são motivos que seguramente capturam o interesse dos gestores para o tema. No entanto, o alcance do movimento mindfulness é mais longo.

Mindfulness pode ser definido como o autoprocesso pelo qual trazemos a atenção da mente para as experiências internas e externas que ocorrem no momento presente. O hábito desse exercício, que pode ser de poucos minutos, tem efeitos imediatos e de longo prazo.

O efeito imediato da meditação mindfulness (MM) é o corte da escalada momentânea da reação de estresse. Ao trazer a mente ao estado presente, ela abandona as tergiversações do que ocorreu (real ou imaginário) e abandona cenários ou monólogos para o futuro. Em minutos a adrenalina cai, a dopamina é reequilibrada, o coração sossega e a produção de cortisol é estancada.

O uso perseverante da MM, mesmo por curtos períodos como por dez minutos, traz efeitos de longo prazo – clareza cognitiva, maior criatividade e o predomínio de sentimentos positivos sobre os negativos – as transformações mais cobiçadas pelos gestores de RH nas instituições organizacionais.

Estudos neurológicos que utilizaram as imagens do cérebro por ressonância magnética revelaram que a MM é acompanhada de desenvolvimento de neurônios em áreas específicas do cérebro, um conceito denominado de neuroplasticidade. Não há nenhuma forma de dieta ou exercício físico ou treinamento mental que faça esse tipo de revolução cerebral.

O desenvolvimento das áreas cerebrais de processamento cognitivo e emocional tem impacto imediato nas atividades do colaborador ou colaboradora de uma empresa. Por exemplo, a solução de problemas que ocorrem no dia a dia mediante o encaminhamento mais claro de soluções traz efetivo benefício para o trabalhador e para o negócio. Isso sem contar que a MM acelera a incidência de respostas criativas instantâneas – os Ahá! criativos – que são acompanhados de picos de ondas gama no cérebro e soluções inusitadas para os problemas à mão.

Como pensa Chade Meng-Tan, criador do projeto mindfulness “Procure Dentro de Você (Search Inside Yourself, da empresa Google no Vale do Silício), os líderes que as empresas buscam hoje são aqueles dotados de inteligência emocional. Um dos pilares da IE é a empatia, a capacidade de reconhecer o que efetivamente vai na cabeça – e no coração – do colega de equipe de trabalho. Se o subordinado entra na sala do chefe apreensivo com o seu desempenho na empresa, haverá mais probabilidade de o colaborador buscar um melhor desempenho se ele perceber que o líder entende os motivos de suas limitações e faz deste entendimento a plataforma para impulsionar a trajetória produtiva do liderado.

Organizações modernas salientam que não há mais separação entre o fora e o dentro da empresa para a vida emocional do indivíduo. Ele é um só e abriga suas emoções onde quer que vá. Se estas são mais equilibradas para a sua vida pessoal, elas também serão equilibradas no trabalho. Se a saúde do trabalhador é melhor, com a redução de fatores de risco como hipertensão e diabetes, tanto a vida própria do trabalhador como sua entrega na produção organizacional serão afetados para melhor.

Por isso, a técnica de meditação mindfulness vem ganhando tantos adeptos. Trata-se de uma solução com baixo investimento e elevado benefício – para a pessoa e para a organização. Vive-se melhor e se trabalha com mais produtividade.

Sim, a ideia de que os executivos estão buscando o lucro com a mesma ferramenta que os monges budistas usam para atingir a iluminação pode parecer um sacrilégio. Mas Meng, do Google, pensa diferente: “Eu gosto de alinhar as qualidades de paz, alegria, compaixão lado a lado com coisas como sucesso e lucro”, diz ele. Ele saliente que o mindfulness parte de um começo – a capacidade de fixar a atenção no momento presente – e prossegue com a clareza de ideias e o autocontrole emocional. “O mindfulness ajuda você a ter sucesso; e você define que tipo de sucesso você deseja”.

Sobre o Autor:

Dr. Martin Portner é Médico Neurologista , Mestre em Neurociência pela Universidade de Oxford e especialista em Mindfulness. Há mais de 30 anos divide suas habilidades entre atendimentos clínicos e palestras, treinamentos e workshops sobre sabedoria, criatividade e mindfulness.

Site: www.martinportner.com.br

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