“O desemprego do homem deve ser tratado como tragédia e não como estatística econômica.”
(Papa João Paulo II)
No início dos anos 1990, experimentei o sabor amargo do desemprego. Por opção, eu deixava um cargo de gerência de filial numa empresa exportadora de café, onde desenvolvera ao longo de apenas dez meses um trabalho que a alçou da 45ª para a 21ª posição no ranking das maiores exportadoras brasileiras em seu segmento.
Era o fim de um ciclo. Não havia mais espaço para crescimento dentro daquela estrutura. Foi quando cunhei a expressão “bater com a cabeça no teto”.
Tomada a decisão, fui enfrentar a frialdade do mercado de trabalho. As expectativas de uma rápida recolocação eram elevadas. Afinal, eu era jovem, impetuoso, determinado e carregava na bagagem uma série de realizações concretas.
O mundo real, no entanto, ensinou-me outras verdades. A tenra idade não era um aspecto positivo, mas uma fragilidade, pois “garotos” de 21 anos de idade não podiam ter a experiência exigida para cargos de supervisão e gerência – assim como “velhos” de 45 anos simbolizavam arcaísmo e retrocesso.
Descobri também a existência de algumas regras para entrar no jogo. A formação acadêmica sólida era a primeira delas. Isso significava, além de uma faculdade de renome, algo óbvio: o curso superior concluído. E eu abandonara meus estudos para assumir o cargo que me fora ofertado, pois seria exercido em outro Estado da federação.
Aprendi, ainda, a irrelevância de dominar o idioma pátrio, na linguagem falada e escrita, ante a fluência em inglês de outro candidato, o qual estaria sempre anos-luz à frente, mesmo escrevendo exceção com dois ou quatro “s” ou pronunciando “poblema” (sic) a cada duas frases.
Em meio a tantas outras descobertas sobre como funciona o “sistema”, observei sete longos meses passarem diante de meus olhos. Ao longo deste período, retomei os estudos, fiz uma série de cursos práticos complementares, reduzi minha pretensão salarial. Mas ao término deste período, como não recebera nenhuma proposta concreta de trabalho, minhas reservas financeiras tinham se exaurido e a autoestima entrado em colapso.
Empreendedorismo de necessidade
Dentro deste contexto, parti para a chamada “carreira solo”. Era preciso fazer algo com o pouco de orgulho próprio que ainda me restava. Era preciso que eu me colocasse à prova. Foi assim que abracei o empreendedorismo como opção de vida. Mais do que uma necessidade, foi minha tábua de salvação.
Duas décadas se passaram desde então. E o mercado de trabalho continua muito próximo da realidade que experienciei. As restrições quanto à idade persistem. A formação acadêmica demanda, nos dias atuais, além do curso superior completo, uma pós-graduação qualquer. O espanhol tem que acompanhar o inglês, permanecendo o português em segundo plano.
O desemprego é um acontecimento medonho. Quanto mais ele se prolonga, mais afeta negativamente o profissional. Quando atinge um pai ou um arrimo de família, então, assume conotação sádica e perniciosa. Apenas quem vivenciou isso consegue entender o porquê do olhar opaco e dos ombros arqueados daquele que não tem a possibilidade de dizer ao mundo a que veio.
Por isso, quero convocá-los a uma campanha pelo desemprego zero. Mas não se trata de uma moção de âmbito governamental. Trata-se de uma atitude, de um lema, de uma profissão de fé. Trata-se de cada um de nós firmarmos compromisso pessoal para buscarmos e permanecermos dignamente empregados, seja num negócio próprio ou de terceiros. Trata-se de você descobrir com a máxima urgência, acima e a despeito de tudo, qual sua vocação. E segui-la.
Isso abrange também os “empregados-desempregados”, uma categoria de pessoas que vendem barato seus sonhos, exercendo atividades que não correspondem ao que seus corações mandam, vagando pelo mundo corporativo como almas errantes.
Espero ver estas pessoas agraciadas pela autoconsciência, para despertarem para quem são; presenteadas pela coragem, para fazerem o que desejam; estimuladas pela ousadia, para empreenderem por oportunidade; e sensibilizadas pela emoção, para levar este princípio adiante, ofertando, sempre que possível, um novo posto de trabalho, industrializando a esperança.
Sobre o Autor:
Tom Coelho é educador, conferencista e escritor com artigos publicados em 15 países. É autor de “Sete Vidas – Lições para construir seu equilíbrio pessoal e profissional”, pela Editora Saraiva, e coautor de outros quatro livros.
site: www.tomcoelho.com.br, www.setevidas.com.br
e-mail: tomcoelho@tomcoelho.com.br
Temos que primeiro e ter força de vontade para superar todos os obstáculos possíveis e depois lutar contra nós mesmos, ou seja nossos paradigmas.
Você deu o Tom da realidade. Desculpe-me o trocadilho, foi inevitável.
O TRISTE é que ainda hoje o mercado de trabalho “funciona” desta lamentável forma e, o que é pior, sem perspectivas imediatas de mudança!
Excelente o assunto abordado neste artigo. Vivencio esta dilema e, infelizmente apenas quem vive isso, consegue entender o contexto de toda a situação. Creio que apesar das dificuldades que vivenciamos, não podemos desistir. Com certeza você terá um aliado, afinal o primeiro passo precisa ser dado. Um forte abraço.
Caro Tom!
Excelente o seu texto. Estou desempregada desde dezembro de 2009 e tenho passado por tudo que você relatou… A diferença é que perdi meu emprego da pior maneira que se pode perder, por uma dessas odiosas “puxadas de tapetes”, arquitetada pelo meu superior e uma colega para a promoção dessa última (unidos por envolvimento amoroso, sendo ambos casados com outros pares). Vi tudo acontecer de mãos e pés atados, só esperando o desfecho dos acontecimentos, sem ter a quem recorrer… Sou administradora, com duas pós graduações, tenho 48 anos e uma trajetória profissional calcada em minha competência e dedicação, jamais tendo sido negligente em minhas atividades, no entanto fui descaradamente preterida por uma alpinista profissional com pouca experiência na função, mas PHd em manipulação de funcionários imaturos. O que faz as empresas de médio e grande permitirem tais ocorrências? Como desarticular situação como essa, uma vez que haja envolvimento de seu superior direto? Avalio se deveria ter tomado alguma atitude, mesmo correndo o risco de precipitar os fatos, já que normalmente a corda arrebenta do lado mais fraco… Restou o desânimo para buscar vaga no mercado formal por todas as razões que você citou; restou a forte sensação de impotência para lidar com situações semelhantes a que passei.
Texto excelente, mas infelizmente sabemos que é difícil colocar em prática esse desejo de se fazer o que gosta! Principalmente quando se trata de um Pai de familia ou quando a esposa precisa complementar a renda mensal. Largar aquilo que te dá subsistência para arriscar em algo novo, interessante e de acordo com a vontade de nosso coração? Muitas pessoas tentaram, lutaram e conseguiram essa proeza.
Mas como fazer, como começar, são tantas atividades interessantes, qual delas se encaixa comigo?
Dúvidas cruéis essas!
Prezado Tom, estive desempregado durante sete meses, tenho 55 anos e entendo perfeitamente seus sentimentos. As corporações e a sociedade em geral estão ante um conflito muito grande relacionado com a idade e a experiência. Se você é novo não serve porque não tem a experiência necessária para as funções a cobrir. Se tiver mais de 45 anos, você tem experiência de mais e é considerado obsoleto. É um grande problema para os recém graduados e para os maduros na profissão. Eu me pergunto, se estivéssemos com uma doença grave, vamos procurar um cirurgião de 30 anos de idade ou um de 50? Quem tem mais chances de ter sucesso na cirurgia? Por que o critério é diferente nas organizações? Por outro lado, se você é novo e sem experiência, deveríamos avaliar se a experiência é mais importante que o potencial de crescimento, a atitude e a criatividade que possa ter um profissional que recém se inicia. Independentemente do considerado acima, no futuro, a tendência é que diminuirão as oportunidades de emprego e aumentarão as oportunidades de contratação de serviços profissionais como autônomo. Atenciosamente, Andrés.
Puxa, parabéns pelo texto, ousadia e determinação no assunto. Vivo o desemprego a 4 meses, sou arrimo de família, e me emocionei com as palavras. Exato, acho que de fato, apenas quem vive isso, consegue entender o contexto de toda a situação, pois tbém me deparei com as falsas expectativas, e a irrealidade do mercado de trabalho.Isso porque sou formada, tenho anos de experiência e 40 anos de idade.Obrigada, suas palavras, me estimularam a continuar, a ter coragem, não desistir nunca da profissão que amo, e não vender meus sonhos baratos, pelo desespero.
Abraços