O cenário brasileiro econômico atual, marcado por instabilidade política, volatilidade do dólar, crescimento do desemprego, inflação em alta e que, juntos, compõem uma conjuntura pessimista pouca vezes presenciado na última década, faz com que as organizações busquem mecanismos para se equilibrar nessa incerteza, manter seus talentos e ainda assegurar a sustentabilidade do negócio.
Esta nova atmosfera dita o rumo no universo corporativo e, consequentemente, impacta a vida da força produtiva. Em meio a isso, a única verdade é que o mundo já não será mais o mesmo e há o consenso de que a sociedade terá de assumir o desafio de viver com ainda mais parcimônia, menos ostentação e, sobretudo, menos desperdício.
Como, dessa forma, as organizações montarão suas estratégias para sobreviver a este tsunami em um ambiente em que, já em 2008, na primeira grande crise do século 21, colocou em prova a solidez das instituições. Não tenho dúvidas em afirmar que no centro deste debate há um grande personagem: o gestor. Afinal, é ele quem tem de utilizar toda a criatividade possível para entregar resultados em um ambiente movediço, austero, restritivo e com controle espartano de despesa.
Fácil? De forma alguma. Asseguro, no entanto, que a solução não exige budget e sim atitude! Simples assim. É possível, sim, produzir resultados surpreendentes na adversidade. Agir e pensar como donos faz com que o gestor supere suas metas e, principalmente, inspire o time, que é sempre o principal ativo das companhias. Isso tudo é accountability pessoal, tema que estudo há 30 anos e não possui tradução para o português, mas que pode ser entendido como a virtude moral do “ir além” do que previsto na descrição do cargo.
Muitos empresários e líderes operam muito bem nesse modo, mas poucos se mantém agindo na mesma intensidade em momentos difíceis. A questão é que, nesses períodos mais desafiadores, boa parte da alta liderança recua, permitindo que o medo e a incerteza contaminem seus processos de decisão. Com isso, os gestores correm o risco de se esquecerem de que sem uma visão positiva do futuro e sem ação, o homem nem teria saído das cavernas. Aí, surge aquilo que refuto como a grande doença do ambiente de negócios: o desculpability.
O contrário de accountability pessoal é a desculpability. Trata-se da habilidade de afastar de si a responsabilidade, culpando os outros, as circunstâncias, ou tudo aquilo que está à sua volta. É como um vírus ou aplicativo pré-instalado que funciona turbinando o nosso instinto de defesa. Nascemos com ele e ele está conosco presente na humanidade desde o início da civilização, o que pode ser percebido em Gênesis, capítulo 3, versículos 11 e 12.
Accountability não é inato. Pode, deve e precisa ser ensinado. E se não for praticado, é facilmente esquecido. Somente quando é vivenciada de forma genuína, tornando-se algo habitual, é que passa a incorporar no coração e mente da pessoa, mesclando um princípio moral com a personalidade.
Empresas que conseguiram incorporar elementos de accountability na sua cultura, quer seja traduzindo como protagonismo, proatividade pessoal ou pensar e agir como dono, vão sofrer menos, vão sair mais cedo da crise e podem até sair mais fortes do que estavam. Não estou sozinho nesta crença. Segundo estudo global da McKinsey & Company, accountability é uma das nove dimensões da saúde organizacional.
Encontrar oportunidades nesse cenário negativo, portanto, pode ser a diferença para a empresa de hoje sobreviver até amanhã. Para isso, é essencial que os gestores enfrentem o período valorizando um novo modo de vida, centrado na essência e na sustentabilidade como valores centrais A accountability é o caminho em direção ao êxito, pois torna viável o engajamento das pessoas em torno de uma causa comum, com mais alegria, e satisfação pessoal, dando um basta á inércia a e estagnação. Nessa direção, uma atitude acccountable é uma vantagem competitiva para transformar a crise em oportunidade.
Sobre o autor:
João Cordeiro é Coach, consultor de gestão, pesquisador, especialista de desenvolvimento profissional e escritor. Autor do livro “A evolução da responsabilidade pessoal, Editora Évora.