Quem trabalha no sinuoso mundo das relações trabalhistas e se imiscui pelos meandros da organização ouve de contratantes reclamações sobre os riscos de administrar o negócio, o dilema entre crescer mais (vale a pena?) ou manter-se no mesmo patamar, o peso da responsabilidade, etc.
Este espaço, normalmente afeito a discorrer sobre técnicas que ajudam os profissionais em geral trata desta feita da situação do contratante, popularmente chamado patrão.
Essa peculiar condição está ligada àqueles empreendedores que carregam na veia a coragem para enfrentar e vencer adversidades, acreditam no amanhã, e teimam frente a um propósito levando o orgulho do sobrenome às gerações vindouras.
Quem contrata é logo submetido às regras da velha CLT, Consolidação das Leis do Trabalho, que intervém fortemente e engessa oportunidades de melhorias recíprocas nas relações laborais. E tem que arcar com encargos ditos sociais que podem ultrapassar a 100% sobre o salário do contratado.
Quem contrata tem que tomar cuidado com os pisos normativos, cada categoria tem um a ser obedecido, fixado por convenção ou acordo coletivo e outras conquistas além da legislação básica, às vezes incluindo participação em resultados ou lucros.
Quem tem obrigação de manter a CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – ganha funcionários estáveis temporariamente, alguns responsáveis que bem cumprem seu papel de agente prevencionista, e outros, aproveitadores de plantão que se refugiam na proteção legal para levar o trabalho ao seu jeito, até tentando nalgumas vezes ganhos imorais com indenizações injustas, na velhaca tese de criar dificuldades para vender facilidade.
Quem tem funcionário eleito membro de diretoria de Sindicato de classe também enfrenta dissonância e convive com a sua estabilidade empregatícia. Há bons dirigentes, negociadores, mas há também os indolentes que se escudam no papel de líder da categoria e não querem trabalhar mais, ficam manhosos, vivem tentando afastamentos e testando o poder de mando da empresa.
E vem os riscos de passivo trabalhista. Das demandas judiciais infundadas e estimuladas por aproveitadores externos, “para ver se pega em favor do hipossuficiente”. Das reclamações por danos morais/materiais. Dos reflexos de acidentes de trabalho que às vezes acontecem por erros operacionais ou distração.
São muitos os aspectos que podem dificultar a boa harmonia entre capital e trabalho, peculiaridades de ordem legal e de caráter pessoal que colocam patrões em polvorosa, colecionando decepções. O tema é extenso:
– O contratante recruta, seleciona, contrata. E depois treina, na certeza de que está formando um bom colaborador, alguém que vai fazer carreira. Quando já está bom, integrado e produzindo bem, sai, pede a conta, diz que não está gostando, surgiu outra oportunidade, ou está endividado…Decepção total. E, às vezes, depois de um tempo você descobre ainda que está no concorrente…
– Você ajusta com o empregado os horários de trabalho, de forma a bem atender as duas partes. Tudo certo. Depois de um tempo que ele se desligou da empresa, recebe uma papelada dobradinha e grampeada, notificando-o de audiência por reclamatória trabalhista. Vai ver…reclamação de excesso de jornada, horas extras, etc…E lá vai você espernear na Justiça Trabalhista, ficando o empregado na frente do “super” patrão, vem tentativa de acordo, despesas com custas, perícias, advogados, etc… E, mais desgaste…
– O empregador está crescendo, precisa de gente para lhe ajudar. Muitos pedem emprego, querem oportunidade. Vem o contrato, o aprendizado (que às vezes traz prejuízos ao contratante, por erros próprios dessa fase), e em seguida, tudo certo. V. descobre que está dormindo com o inimigo. Alguns bens estão sumindo, ou o caixa não vem batendo, o estoque fica inconsistente, inventário não “bate”… E você não pode nem acusar de qualquer forma, tem que tomar cuidado ainda para não levar um processo por danos morais.
– Você chama alguém para trabalhar consigo, acha que está fazendo o maior favor em “dar emprego”, espera a maior retribuição com envolvimento e comprometimento de parte do contratado. E, de repente, começa a ter pela frente um boca-dura-respondão, nada está bom, mal humor freqüente, desleixo, má vontade, atendimento ruim, e você perdendo clientes. Tem que demitir, pagar inclusive multa fundiária, aviso prévio, etc.
Se o leitor teve experiência de contratante deve estar se lembrando de alguma história tão ou mais desgastante. Na medida em que as organizações se estruturam sofrem menos e melhoram os resultados da força de trabalho, mas ninguém está livre de alguma decepção ou frustração.
No admirável campo das relações humanas tudo é possível: você tem muitas alegrias, revela verdadeiros talentos em habilidade e bom-caratismo, mas também pode trombar com a fragilidade humana ou, principalmente, pelas expectativas do empregado não se alinharem com as expectativas do empregador, ruas paralelas que nunca chegarão num porto seguro e único.
“Não sois máquinas, homens é o que sois!…”
Mas, vamos parando por aqui para não desestimular novos e vibrantes empregadores. E também porque há muitos desempregados, e dos bons, aguardando oportunidades e desafios.
Sobre o autor:
Celso Gagliardo é profissional de Recursos Humanos e Comunicações, graduado em Direito e especializado em Recursos Humanos, habilitado consultor de Pequenas e Médias Empresas. Prestou serviços como técnico, executivo e consultor em várias empresas nacionais. Foi redator de jornal, é palestrante e treinador. Fundador e membro de Grupos de Recursos Humanos (atual CEPRHA), e diretor da PH – Patrimônio Humano, Consultoria e Serviços. Atualmente é gestor corporativo de RH do Grupo Estrutural.
e-mail: gagliardo@vivax.com.br
Ótimo texto!
Com certeza é isso mesmo o que vemos na maioria de nossas empresas….
Excelente texto! Poderia tecer inúmeros elogios. Em, aproximadamente, 10 anos como empregadora e contratante vivenciei inúmeras situações descritas pelo prezado autor. É necessário aprimoramento, experiência e reunião de esforços com pessoas que tenham objetivos comuns para atingir êxito nas relações entre empregado e empregador. Um pouquinho de sorte, claro, ajuda também!