Ao cursar uma pós-graduação em petróleo, gás natural e biocombustíveis, conheci o sonho de vários colegas de classe em fazer parte de uma empresa da cadeia de produção e fornecimento de petróleo e gás natural. A divulgação, na imprensa, de dados sobre as descobertas e desafios do pré-sal tem influenciado legiões de pessoas na escolha de cursos voltados à área de energia.
Mas, as expectativas das empresas e dos profissionais são compatíveis?
“A empresa dos sonhos”
Entre 2009 e 2012, a Petrobras conquistou os primeiros lugares na pesquisa intitulada “A empresa do sonho dos jovens”, realizada pela Cia. de Talentos (1).
Os principais motivos dos votos da pesquisa de 2012 foram:
- Desenvolvimento profissional
- Fazer o que gosta
- Boa imagem no mercado
- Desafios constantes
- Qualidade de vida
- Salário e benefícios diferenciados
Todos esses itens são muito interessantes, mas vale apresentar algumas considerações :
- Itens 1 (desenvolvimento profissional) e 4 (desafios constantes) versus o item 5 (qualidade de vida) : a definição de qualidade de vida, por uma mesma pessoa, pode variar ao longo dos anos, mas frequentemente, a convivência com a família e amigos tem uma correlação forte com este conceito. Porém, a carreira na área de energia pode exigir uma mobilidade que distancia a pessoa de seus entes queridos, por longos períodos. Filhos pequenos e/ou pais idosos podem influenciar a decisão da pessoa em não atuar, num determinado momento, na área de petróleo e gás natural. Conheço um engenheiro de perfuração de poços que, antes de ter a oportunidade de atuar na Bacia de Santos, trabalhou em diferentes estados brasileiros, na Turquia, e em outros países, durante anos. Ele mesmo diz que para se atuar em petróleo e gás natural são necessários: mobilidade e inglês fluente.
- Item 2 (fazer o que gosta): é imprescindível em qualquer carreira. Eu incluiria: “fazer o que gosta, com quem se gosta e com sentido de propósito”.
Segundo reportagem da revista Época Negócios Online, que foi ao ar em 9 de agosto de 2012 (4), o título já anunciava “Funcionários não deixam más companhias. Eles deixam chefes ruins”. Um reconhecido estudo, o Leadership Quarterly, publicado pela Universidade do Estado da Flórida, justifica tal raciocínio. De acordo com os dados tabulados, os trabalhadores indicaram como principal motivo do desligamento das empresas o desempenho ruim dos seus respectivos supervisores, evidenciado por atitudes como :
– não conseguir cumprir as promessas;
– fazer comentários negativos sobre eles para os outros funcionários ou gerentes;
– invadir sua privacidade;
– culpar os outros, para encobrir erros pessoais ou minimizar a situação.
Qual o critério ou o processo utilizado para se promover os profissionais à supervisão/coordenação? E para se demitir os mesmos? Geralmente, contrata-se e promove-se por atributos técnicos e demite-se pelos comportamentais.
Parece-me pouco provável que alguém só faça aquilo que gosta, todo o tempo. Mas, tão importante quanto, é fazer parte de uma verdadeira equipe e que seja liderada de maneira genuína, para se realizar algo que faça sentido à vida da pessoa, com agregação de valor, e que permita deixar algum tipo de legado positivo.
- Item 4 (desafios constantes) versus o (novamente) item 5 (qualidade de vida): na busca de novos desafios, podem ocorrer algumas surpresas no trajeto e o profissional pode lembrar com uma certa saudade do passado: um projeto especial, a última área na qual atuou, uma equipe da qual fez parte, e ainda, da última posição ocupada, A mudança de atuação de especialista para generalista, ou coordenação, pode significar um novo rol de atividades, que não satisfaçam as expectativas do profissional.
- Item 6 (salários e benefícios diferenciados): é possível que para os respondentes da pesquisa citada, inicialmente (universitários e recém formados de 17 a 26 anos), os salários e benefícios sejam bastante importantes. Mas, ao longo da carreira, o que deverá contar, também, são questões como valorização, feedback, reconhecimento, meritocracia, que vão muito além da remuneração total.
“Os profissionais dos sonhos”
Segundo a Cia. de Talentos, as empresas para as quais assessorou ao longo de 2011, desejavam empregados que apresentassem:
- Orientação para o resultado
- Comunicação
- Construção de relacionamento
- Trabalho em equipe
- Orientação para o cliente
Estes itens estão relacionados às questões comportamentais, ao mesmo tempo que boa parte dos programas de cursos voltados à área de energia são extremamente técnicos. As empresas, segundo a fonte acima, esperam que os seus empregados se comuniquem bem (item 8), construam relacionamento (item 9) e trabalhem em equipe (item 10). Disciplinas que despertem a reflexão dos alunos para a necessidade destas habilidades não fazem parte, normalmente, das grades dos cursos de graduação e de pós-graduação na área de energia.
- Item 10 (trabalho em equipe): só é possível quando a empresa dá condições para que o mesmo seja desenvolvido e quando há estímulo desta prática. Em muitos casos (de empresas e de universidades), o desempenho individual é o que conta, e não o da equipe.
Não raro, nas universidades (incluindo os programas de pós-graduação) os professores preferem aplicar “provas individuais” a “trabalhos ou seminários em grupo”. Com isto, perde-se a oportunidade de se desenvolver o hábito de trabalhar em times.
Ao se trabalhar em equipe, nas universidades e nas empresas, as pessoas precisam: se comunicar bem (item 8) – não só falar bem, mas escutar de maneira empática, respeitando as opiniões, às vezes, não coincidentes, dos outros, além de ter a capacidade de argumentação e negociação.
A valorização do indivíduo, em detrimento ao coletivo, está presente em muitas culturas. No ambiente empresarial existe, ainda, uma competição pela conquista dos lugares mais próximos do topo da estrutura organizacional. Portanto, incentivar o trabalho em equipe pode ser mais viável no ambiente acadêmico, com possível influência do comportamento nas empresas.
- Item 11 (orientação para o cliente): quando se imagina que esta questão já está superada, que é assunto da década de 1980, basta lembrar como somos tratados no dia a dia, como consumidores e clientes e fica evidente que existe espaço para uma forte atuação. Recentemente, apresentei uma palestra numa faculdade, onde alguns alunos estavam cursando o último ano de Engenharia Química. Quando mencionei Edward Deming e outros “papas” da qualidade, os alunos ficaram curiosos sobre o tema. Fiquei surpreso! Como esperar que os profissionais tenham foco no cliente, sem terem estudado, profundamente, as ideias destes notórios especialistas ? Só para destacar, o Prêmio Nacional da Qualidade no Japão, criado em 1951, foi batizado de Prêmio Deming.
Parece-me que os profissionais com perfis técnicos saem dos cursos (graduados/pós- graduados) mais técnicos do que entraram. Uma formação mais abrangente, incluindo disciplinas na área de humanas, seria muito valiosa nos tempos atuais.
Em alto mar
Quando se fala em petróleo e gás natural, frequentemente se pensa em uma plataforma de produção ou numa sonda de perfuração marítima. Existem muitas oportunidades de carreiras, além daquelas que envolvem atividades de profissionais “embarcados”. Além disto, apesar da Petrobras ser frequentemente lembrada, quando o assunto é relacionado à energia e, mais recentemente, em função do pré-sal, existem inúmeras empresas nessa cadeia produtiva. Portanto, as oportunidades não residem, somente, nos quadros da gigante petrolífera brasileira. Segundo o Instituto Brasileiro do Petróleo – IBP (3), a edição da Feira “Rio Oil and Gas”, de 2012, reuniu 1.300 expositores, o que demonstra esta extensa cadeia de fornecimento.
Porém, para aqueles que almejam desempenhar atividades que exigem a atuação em embarcações, gostaria de lembrar a história da conhecida família Schürmann (2), que navegou a bordo de uma embarcação por 10 anos. Como as famílias que levam um estilo de vida mais tradicional (em terra firme), os Schürmann relataram momentos de dificuldade no relacionamento interpessoal, o que é de se esperar. Mas, o que fazer a bordo, quando os humores se alteram ? Tanto o espaço menor (comparado ao de uma residência tradicional), quanto os afazeres constantes e a necessidade de comunicação, impedem o “luxo” de que o período de “crise” dure mais que algumas horas…
A experiência da família Schürmann pode se assemelhar àquela vivida numa plataforma ou sonda marítima, onde os profissionais ficam embarcados por longos períodos, com outros, sem o laço de sangue. Se para algumas pessoas a qualidade de vida tem a ver com a convivência com a família e amigos (fora do ambiente de trabalho), o regime de trabalho embarcado pode não satisfazer a todas as pessoas.
Obviamente, estou apresentando um exemplo que envolve condições mais extremas, para reforçar a importância dos aspectos comportamentais. Claro que nem todos os profissionais da área de petróleo e gás natural trabalham em plataformas ou em sondas! Existem muitas outras opções de carreiras em áreas de apoio.
A atração de profissionais experientes
O fascínio pela área de petróleo e gás natural pode ser observado, também, em função da atração de profissionais, mais experientes, egressos de outras áreas. “Talento magnético: a consequência natural … é que os executivos de talento provavelmente são atraídos por empresas com boa reputação (item 3 – boa imagem no mercado) na formação de funcionários. Talento atrai talento.” (5).
Este “fenômeno” é observado e comentado, com frequência, no legendário enclave tecnológico do Vale do Silício, onde florescem empresas como Microsoft, Google, Facebook, entre outros ícones dessa safra. Mas, podemos entender que, isto também ocorre em outros segmentos e em outras regiões do planeta.
Só para ilustrar, conheço alguns profissionais que migraram da indústria automobilística para a área de energia, com atuação em fabricantes de umbilicais, de árvores de natal molhadas, em fornecedores de soluções tecnológicas em exploração, perfuração, produção e descomissionamento de poços. Todos esses profissionais vieram de uma indústria que possui forte cultura voltada à qualidade, inovação, com atuação em ambientes extremamente competitivos. Daí a lógica do interesse das empresas por esses profissionais e vice-versa.
Considerações finais
Quando se fala nas oportunidades do pré-sal, deve-se lembrar do lado humano: das expectativas das pessoas, não só em ganhar o seu sustento, mas em realizar os seus sonhos – profissionais e pessoais – e na busca da felicidade, ao desenvolver uma carreira na área de petróleo e gás natural. Para isto, os valores individuais devem estar alinhados aos corporativos.
Na busca deste plano ideal, acredito que a abordagem da capacitação de profissionais extremamente competentes deve incluir mais do que as questões técnicas.
Fazer parte de equipes de pessoas altamente capacitadas e, até coordená-las, requer habilidade em lidar com diferentes perfis profissionais e pessoais, de várias faixas etárias, de diversas nacionalidades e com necessidades e anseios singulares.
Bibliografia:
1) http://www.ciadetalentos.com.br/esj/brasil.html
2) http://www.schurmann.com.br/
3) http://www.ibp.org.br/main.asp?Team={70BDA2BC-8CA1-48A6-8B9A-DF11C9B56F6C}
5) Artigo “A guerra pelo talento”, de Stuart Crainer e Des Dearlove, publicado na Revista HSM Management, ano 4, número 20.
Sobre o autor:
Ronaldo de Fávero : consultor empresarial desde 1992; professor de geologia do petróleo e gás natural/análise de petróleo e gás no Colégio Pentágono e de desenho técnico e fluxogramas industriais na Fapen, em Santo André; pós-graduado em petróleo, gás natural e
biocombustíveis pelas Faculdades Oswaldo Cruz; pós-graduado em qualidade pela Universidade São Judas Tadeu; graduado em Bacharelado em Matemática pela Fundação Santo André; cursando MBA em RH no INPG
e-mail: ronaldo.favero@terra.com.br
Fonte: Revista Brasileira de Engenharia Química | 2º quadrimestre 2013
Meus parabéns… ótimo artigo!
Ronaldo; parabéns pelo artigo, você trata o assunto com uma clareza e objetividade impar.
Que o Pré-sal traga este e outros beneficios. Forte abraço.
Olá Ronaldo. Seu artigo é muito interessante e rico, pode ser utilizado como base para várias discussões envolendo as expectativas dos profissinais, não só os mais jovens, mas, qualquer profissional que tenha brilho nos olhos e busque o crescimento. Refletir sobre o que foi exposto ajuda-nos a compreender nosso próprio caminho.
Forte abraço.
Ronaldo!!!
Como sempre, pensamentos claros, pontos objetivos e que agregam valores.
Parabéns e Sucesso.
Parabéns, Ronaldo!!!
Excelente artigo … centrado e claro para os nossos jovens profissionais. Abraços, Stella
😉
Olá , Ronaldo .
Muito interessante sua reportagem .Envolvente e não cansativa .
Abraços, até a próxima . Mello
Ronaldo, eu com 30 anos de petróleo, aposentado, consultor SS O&G e não tão otimista com o pré-sal, vejo que com as novas plataformas de energia dos USA (gás de xisto), da China (eólica e solar) e da Alemanha (eólica, solar, nuclear e híbrida), a nova entrada no mercado do petróleo do Iran vão mudar o conceito de uso da energia fóssil. Basta que estes países se declarem não mais dependentes do Oriente Médio para os preços despencarem e tornarem inviável a produção do pré-sal. Tudo isto não acontecerá de imediato, mas em uma década provavelmente reeditaremos os mesmos erros do “Pró-alcool”, lembra dele? Por erros políticos sucateamos o bonde do pró-alcool e corremos os risco de nem pegar o bonde do pré-sal.
Conclusão:
Aos jovens sonhadores com as oportunidades do pré-sal, recomendo diversificar as oportunidades pois o pré-sal não será a “salvação da lavoura” como se apregoa hoje.
Parabéns pelo Artigo Ronaldo!
Abraços,
Parabéns, Ronaldo!
Sucesso!!!
Não é à toa que é professor…Abraços.
O Lula se candidatou com o PRÉ SAL, se reelegeu com o mesmo PRÉ SAL, a Dilma de elegeu com o PRÉ SAL e o carro chefe vem novamente o mesmo PRÉ SAL. Quero parabenizar por suas conquistas é realmente fascinante, ficaria mais feliz se outras pessoas fossem beneficiada quando o projeto realmente der inicio.
Caro Ronaldo
Muito coerente seu artigo em especial com a formação do profissional na área de petróleo e as concessões da própria vida. Vou trabalhar em sala com os alunos de gestão de pessoas.
Abraços
Prof. Ronaldo, parabéns pela aprovação do trabalho! De forma bem clara e consciente, o artigo apresenta elementos que demonstram a importância de se desenvolver uma visão sistêmica e complexa, ao refletirmos sobre o emprego dos sonhos. Ao observarmos alguém em um determinado cargo ou função, tiramos uma fotografia instantânea. Não sabemos o que ele fez ou deixou de fazer anteriormente para estar ali, naquela posição. Nós professores, continuaremos a estimular estudantes no desenvolvimento de conceitos importantes e de habilidades para trabalhar em equipe. Muitos alunos ainda entendem que o professor, ao pedir o desenvolvimento de projetos por grupos, ” repassa” a função de ensino ao estudante. A educação moderna não mais comporta este tipo de pensamento. Estudantes precisam conhecer e aplicar conceitos. Entretanto, além disso, devem trabalhar em grupo, exercitar a exposição oral e escrita, reflexão, pensamento crítico. Devem saber utilizar a Internet para encontrar fontes e devem poder criticar o que encontraram, acrescentar ou até discordar. Atividades com estes propósitos podem levar mais tempo e exigem mais de estudantes e de nós, professores. Mas, acredito, o retorno é mais provável. Um grande abraço do Ilan. Sucesso!
Parabéns!
Sucesso!!!
Prezado professor, gostei muito do tema abordado. Os verdadeiros profissionais não são maquinas ou robos, sabem interagir, criar, buscar, inovar e mais do que nunca gostar do que faz!
😆 😆
Prezado Ronaldo, gostei muito do seu artigo. Ele fala sobre pontos chaves sobre escolhas na vida profissional e que muitas vezes percebemos que são conflitantes somente após fazer tais escolhas, o que acaba nos tornando um pouco mais experientes com o passar dos anos.
Parabéns e sucesso!
😀
Muito Bom!
Muito bom
Caro Prof. Ronaldo! Adorei o artigo e o tema desenvolvido! Meus parabéns e muito sucesso!