As organizações da era pós-industrial têm aumentado sua busca frenética por atender mais e melhor os seus clientes e potenciais consumidores. Por conta disso, essas empresas, estão se vendo obrigadas a rever/aprimorar seus processos, incluindo aí, os de RH.
Grosso modo e, segundo Gonçalves (2000:2), processo é qualquer atividade ou conjunto de atividades que toma um input, adiciona valor a ele e oferece um output a um cliente específico. Assim, esses processos (os de RH) têm como objetivo, servir de equilíbrio emocional (entre outros) aos trabalhadores das organizações, na medida em que essas empresas precisam de seus recursos humanos preparados e qualificados na interlocução direta junto aos clientes (ou potenciais clientes). Ou seja, o preparo desses trabalhadores é fator crítico de sucesso na medida em que essa ação serve como força geradora de valor para as organizações, bem como de satisfação das expectativas para os clientes-consumidores (o objetivo final de todas as organizações).
Para tal, as organizações investem significativos ativos em seus recursos humanos a fim de mantê-los ajustados às demandas dos clientes-consumidores, bem como as demandas dos mercados globalizados.
Todo este investimento, e isso têm que ficar bem claro, não é gratuito ou filantrópico, bem como não é concedido de forma indiscriminada e/ou aleatória; o RH deve planejar e aplicar estes recursos na organização de forma criteriosa a fim de atender aos anseios dos clientes e as orientações estratégicas dadas pelos acionistas, bem como pelo direcionamento que o mercado está dando.
Sorj (2000) em seu artigo intitulado “Sociologia e Trabalho: mutações encontros e desencontros”, além de fazer uma bela leitura do cenário de macrotransformações por que passam as empresas da era pós-industrial, traz à cena uma discussão acadêmica e empresarial que se faz necessária e que vem ratificar a importância do tema que quero resgatar neste artigo: o recrutamento e a seleção nas empresas do setor de serviços da era pós-industrial.
O que ela pontua é mais ou menos o seguinte: nas empresas da área de serviços, com o foco na produção de bens intangíveis, há uma espécie de relacionamento interativo (ou contato direto) entre produtor e comprador, gerando dessa relação uma espécie de um envolvimento comportamental relacional. Ou melhor, quando um cliente contata sua empresa através de um colaborador seu, surge aí um novo modelo de relação de trabalho que escapa completamente ao padrão tradicional de relação comercial/industrial. Ou, no limite, há uma nova interação entre esses dois “agentes”, e que precisa ser mais bem estudado-compreendido pelo RH, pela gestão das empresas de uma maneira geral, bem como pelas Ciências Sociais. (Sorj, 2000:11-12)
Esses profissionais, continua Sorj (2000), são vendedores de grandes cadeias varejistas, trabalhadores de restaurantes, hotéis, secretárias, enfermeiras, caixas de supermercados e lojas etc. Estas categorias profissionais se caracterizam por grande interação com os clientes-consumidores de suas marcas, produzindo importantes sinalizadores do valor do produto para o cliente. Ou melhor, essa estreita relação (profissional e de trabalho junto ao produto) transforma o trabalhador desse ramo numa espécie de extensão do mesmo. Recebendo, bem como repassando ao produto, elementos de um para o outro e vice-versa. (p. 12-13)
Esse tipo de trabalho vai exigir (na verdade exige) que cada contato entre o trabalhador e o cliente-consumidor, uma adequação (sintonização) das emoções do trabalhador à emoção do cliente. Assim, o trabalho passa a ter uma relação emocional, bem como ajustada aos clientes. Ainda, e aí cabe ressaltar-comparar que essa nova relação não tem mais nada a ver com o modelo mecanicista das relações dos escritórios da era fordistas-tayloristas tão bem dissecado por Braverman (1981). Ou melhor, nos escritórios do modelo de capital monopolista, seguindo a orientação mecanicista de Taylor e Fayol (com o cliente) era revestida de um foco maior na objetividade e na padronização dos meios e posturas, através da orientação determinística do comportamento que o trabalhador deveria ter, estipulado pela gerência e/ou supervisão. Assim, nesse novo modelo de organização do setor de serviços pontuado por Sorj (2000), passa por uma revisão e reflexão; e, aponta para um alto grau de subjetividade e de integração entre os atores desse novo cenário. (p.13)
Bom, se isto é verdade, há que se rever à estruturação dos processos seletivos (como os outros processos de RH) para esse segmento produtivo que só tende a crescer.
Se o que Sorj (2000:13) escreve faz sentido, chegou a hora de revermos esses nossos processos de recrutamento e seleção de nossas organizações, pelo menos, para esse segmento produtivo. Ou melhor, temos que rever nossos paradigmas de estruturação de perfil, pré-requisitos, dinâmicas de grupo, provas de conhecimento e testes psicométricos e demais sistemas de avaliação e controle, dos nossos processos seletivos. Enfim, deveremos repensar todo o modelo praticado hoje a fim de melhor ajustá-lo à nova realidade que se apresenta, que é a realidade de um trabalhador que dialoga, interage e interfere no processo, bem como sofre os impactos desse novo cliente-consumidor que agora pressiona pela elevação da qualidade dos seus serviços, não só diretamente ao trabalhador, bem como na gestão do trabalho de uma maneira geral.
Assim, o profissional de RH deverá ter em mente que esse profissional terá que possuir novas capacidades e expertises. Terá que ter em mente que esse trabalhador será (ou deverá ser-ter) possuidor de significativas capacidades de relacionamento interpessoal; que este trabalhador do setor de serviços transitará e integrará o seu trabalho ao produto do trabalho que está vendendo. E este à sua própria figura, visto que o trabalho desse trabalhador desse segmento será o próprio produto que está vendendo.
Para finalizar e, voltando a Gonçalves (2000), se as organizações são grandes coleções de processos (inputs e outputs), claramente definidos, esse segmento deverá ter uma nova equipe de trabalhadores antenadas e preparadas para essa transformação (configuração do trabalho), bem como e, isso tem que vir a baila, deverá exigir do profissional do RH novas (também) expertises, qualificações e atitudes, a fim de dar respostas a essas novas demandas desse setor produtivo dessa nova era.
Referências:
BRAVERMAN, Harry. Trabalho e Capital Monopolista. Editora Jorge Zahar. Rio de Janeiro, 1981.
GONÇALVES, José Ernesto.As Empresas São Grandes Coleções de Processos. Revista de administração de Empresas. V. 40. n◦ 1. São Paulo, 2000.
SORJ, Bila. Sociologia e Trabalho: Mutações, Encontros e Desencontros. Revista Brasileira de Ciências Sociais. V.15. n◦43. São Paulo, 2000.
Sobre o autor:
Angelo Peres é Mestre em Economia, Pós-graduado em Recursos Humanos, Marketing e Gestão Estratégica, Professor universitário, Palestrante e instrutor em programas de treinamento; Sócio-Gerente da P&P Consultores Associados.
e-mail: ppconsul@unisys.com.br