O Mito da Responsabilidade Social das Empresas

Adm. Wagner Siqueira
Adm. Wagner Siqueira

É uma doce ilusão julgar que mudanças voluntaristas produzidas por empresários progressistas sejam capazes por si só de transformar o sistema econômico, garantindo-lhe algum sentido de espírito publico e de bem comum.

As mudanças incrementais produzidas nos estamentos burocráticos das macro corporações modernas não são suficientes para humanizá-las. É necessário que o processo de mudança seja sistêmico e globalizante, abrangendo os conceitos, as estruturas e a lógica que permeiam a atual ordem econômica mundial. As mudanças incrementais restritas em nível organizacional strictu sensu são fadadas, cedo ou tarde, ao fracasso.

É comum as organizações anunciarem políticas de valorização de recursos humanos ao mesmo tempo em que promovem drásticos cortes de sua força laboral, sempre em nome dos imperativos da racionalidade de gestão, do combate ao desperdício e do controle de custos. Buscam surfar na onda das políticas e das práticas da proteção ambiental na medida em que essas lhes propiciem melhor imagem pública e aumento de sua capacidade de venda, sob a ostentação do indefectível selo verde de qualidade.

Apregoam as maravilhas de seus programas de distribuição de lucros aos empregados, mas cortam salários, benefícios, direitos e garantias trabalhistas e previdenciárias. Apresentam-se como empresas-cidadãs, sempre ávidas dos privilégios fiscais e tributários que julgam merecer. Os bancos brasileiros, por exemplo, têm belíssimos programas de responsabilidade social concomitante à aplicação dos juros mais escorchantes do mundo.

É preciso, assim, desconstruir as ilusões que embalam hoje em dia muitos profissionais bem intencionados que militam nesses programas no mundo das corporações em todo o mundo. O mais das vezes, por trás das novas crenças da responsabilidade social, da participação acionária, das empresas-cidadãs, por trás de muitas dessas práticas que se pretendem nobres, puras, éticas e transcendentes, subsistem interesses escusos, escolhas inconscientes, verdades mais profundas ainda não percebidas e, quando não, inconfessáveis. Essas práticas poderão ser bem mais consequentes e contributivas à melhoria do mundo do trabalho se aprendermos a desconfiar das evidências, das ideias prontas e aparentemente generosas, para tentar perceber, em sua essência, o que há por trás de cada uma delas.

É claro que não podemos pensar que todas as organizações que se dedicam aos programas de responsabilidade social não os façam de forma legítima e lícita. Mas é preciso estar sempre alerta sobre todos para podermos separar o joio do trigo. E, só assim, fazer avançar a verdadeira democracia cidadã.

Sobre o autor:

Adm. Wagner Siqueira: Atual Presidente do Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro e Membro da Academia Brasileira de Ciências da Administração. Foi Secretário de Administração, Presidente do Riocentro e Secretário de Assistência Social da Prefeitura do Rio. Consultor de organizações e autor de livros e diversos artigos sobre as ciências da Administração.

site: www.wagnersiqueira.com.br

e-mail:  wagners@attglobal.net

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5 Respostas para "O Mito da Responsabilidade Social das Empresas"

  1. Leonardo Aguiar Morelli · Editar

    Volto a ressaltar o perigo de tratar como MITO uma OBRIGAÇÃO. Os pontos assinalados no artigo são evidentes no Brasil pela falta de mecanismos eficazes de controle social das atividades produtivas.

    Apenas com a adoção do conceito de CERTIFICAÇÃO SOCIAL DE QUALIDADE por instituições sociais independentes será possível evitar as distorções mencionadas, incluindo a obrigatoriedade da evidenciação de dados sociais e ambientais em conjunto com as informações econômicas e financeiras nos balanços contábeis das empresas.

    Muitas empresas, como citado no artigo, buscam na publicação de “balanços sociais”, se adequar à evolução da comunicação corporativa.

    No entanto, tal instrumento cada vez mais vem perdendo credibilidade, na medida em que se assemelha a uma peça publicitária, sem efetiva garantia de boa governança corporativa, pois seus autores e subscritores não sofreriam qualquer restrição ao omitir ou manipular dados.

    Dar plena transparência a seus dados sociais e ambientais, como pressupõe a UNCTAD/ISAR, é garantir a seriedade de suas informações. Seus autores – da mais alta administração às áreas técnicas – assumem responsabilidade concreta quanto às informações publicadas pela área financeira e que podem ser monitoradas e auditadas.para maior segurança a órgãos reguladores e à sociedade em geral.

  2. Edmundo Pereira Júnior · Editar

     A responsabilidade primária de uma organização é ser lucrativa. A partir daí ela pode contribuir com a sociedade.

  3. Excelente artigo 😉 Infelizmente ainda esta parece ser mesmo a gde realidade…com suas algumas exceções.
    Clauver, seus argumentos são bons, porém, no meu entendiemnto, o exemplo da Toyota “buscar encontrar veículos que emitiam menos poluentes e utilizavam outras fontes de combustíveis”,é mto raso. Pois não se trata de resposnsabilidade social, é sim, mais que obrigação, é sistema de gestão, mais conhecida hj, como sistema de gestão ambiental, né!
    em relação a microsoft, não conheço suas ações nesta área, porém, aponto que ela tem tbm a obrigação de abzraçar a causa do lixo eletronico, que é gravissimo atualmente.
    promovendo e investindo em pesquisas de materiais menos impactantes, bem como em logistica reversa…e não só nos EUA!!!! Isso sim, seria uma ação arrojada de responsabilidade socioambiental e não só ficar fazendo inclusão digital, o que é mto valido tbm, mas tbm para formar mais e mais consumidores.
    abraço!

  4. Clauver Estanislau Soares · Editar

    Entendo a crítica feito a responsabilidade social, porém falta profissionais que vejam esta questão como uma característica do negócio, seja como demanda social por práticas mais responsáveis ou como estratégia do negócio.
    Sou totalmente contra políticas de responsabilidade social assistencialistas, ou programas socias com o mesmo fim.
    Responsabildiade social pode ser um diferencia de negócio, temos exemplo disto, mas para isso dar certo as empresas em questão devem pensar em programas que tenham haver com seu negócio.
    Por exemplo a Microsoft tenta e financia a doa computadores para escolas da rede publica (Não apenas nos EUA) e em contra partida seus funcionários se disponibilizam a dar cursos em suas comunidades para ajudar a desenvolver e acabar com o analfabetismo digital.
    A Toyota buscou encontrar veículos que emitiam menos poluentes e utilizavam outras fontes de combustíveis.
    Este tipo de ação que deveria ser foco nas instituições e não distribuir alimento no final de ano.
    Pensem uma coisa hoje em dia quantas folhas de papel recebemos de nossas empresas de telefonia (celular e fixa), as empresas permitem ue você para de receber a conta impressa e receba apenas na versão digital. consideando o número de usuários do Brasil, que deposi de um tempo joga fora estas folhas, não seria interessante campanhas para concientizarem a sociedade desta questão, A empresa deixaria de gastar tanto com papel, e poderia reverter inclusive esta economia para reflorestamento, sem afetar seus rendimentos ou relação com o consuidor, pelo contrário reforçaria o conceito da marca.
    Será que a idéia de responsabilidade social está errada ou sua aplicabilidade está torta?

  5. Muito bom o artigo que levanta de forma objetiva uma questão que deve ser tratada de forma ampla, porém profunda. Talvez uma das abordagens para se resolver esse dilema a médio e longo prazo seja ampliar o conceito de lucro, não limitando-o a resultado financeiro, mas inserindo as responsabilidades ambiental e social. Parabéns pelo belo texto!

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